SANTA REVOLUÇÃO.

(Sobre a polêmica "quebra da santa" na Marcha das Vadias RJ)

Fonte: AFP. "Marcha das Vadias - RJ"


“Uma santa para cada mulher queimada na inquisição. Uma santa para cada vítima de AIDS. Uma santa para cada homossexual agredido em nome do cristianismo. Uma santa para o estigma social colocado nas religiões de matriz africana pelo cristianismo. Uma santa para a relação íntima entre a Igreja e os governos fascistas europeus. Uma santa para a guerra santa. Uma santa para cada livro queimado. Uma santa para cada bilhão de dólares acumulado. Uma santa para cada criança vítima de um padre pedófilo.“


A reação do oprimido não é a mesma coisa que a violência do opressor.


Temos aqui uma Igreja Católica que há mais de dois mil anos oprime, ofende e mata mulheres. Oprime, ofende e mata homossexuais. Oprime, ofende e mata quem não aceita seus dogmas.
É muito benevolente, é muito bonito e é muito católico reproduzir o discurso de que "é preciso respeitar pra ser respeitado". Mas essa é uma falsa simetria. 

Afinal, o desrespeito por parte da Igreja reverbera há mais de dois mil anos. 
Será que eu tenho que sorrir e acenar pra um católico que impede os meus direitos essenciais?

O meu feminismo é contra a Igreja, sim. Pois é essa igreja que me coloca como submissa e e privilegia o homem. Que tira o direito de escolha sobre meu corpo, minha sexualidade, meu útero.
E me deprime perceber que as pessoas se comovem mais com a imagem de uma santa quebrada que representa uma religião do que com uma pessoa que é assassinada em nome dessa religião.
Nosso conceito de fé é muito medieval. Sua fé é particular, tanto é que você pode ser católico e usar camisinha (DEVE). Mas os católicos tem um líder da igreja que diz que isso é pecado. Contradição? O papa que eles veneram traz à tona toda a medievalidade de uma instituição que não funciona mais (mas que ainda arrecada muito dinheiro...)

Assim como quebraram uma santa, há milhares de séculos umbandistas tem tido seus terreiros destruídos, suas oferendas chutadas (o que aliás, virou piada nas mãos do opressor), evangélicos são "eternos inimigos" e as outras religiões são todas do capeta. E... NÃO. "Chutar uma macumba" e quebrar uma santa não equivalem ao mesmo ato de desrespeito à religião. Porque uma religião tem sido historicamente superior à outra. É como fazer uma marcha contra o imperialismo e reclamar se queimarem uma bandeira dos EUA. É como ir numa manifestação contra um governo corrupto e não se revoltar contra os políticos que operam esse sistema.

É impossível protestar sem que o opressor se sinta ofendido.

E ao contrário deles,
essa atitude não matou ninguém.



Porém, no entanto, todavia...


Cheguei à conclusão de que, de qualquer forma, não foi uma atitude política inteligente. E toda e qualquer Marcha (ou pelo menos, a das Vadias) tem um viés político muito bem fundamentado.


A luta feminista é pelo fim da opressão contra as mulheres, seja essa opressão psicológica, sexual, comportamental, etc. E por mais que eu tenha minha crença de que religiosidade é bobagem, muitas mulheres levam à ferro e fogo o significado que uma santa de gesso possui. (E também santas que aparecem talhadas em pedaços de madeira. Ou jesus cristos que aparecem nas nuvens. Enfim).

Logo, afastamos da luta mulheres que também são oprimidas, mas que por possuir determinadas doutrinas, segregam-se de uma luta que sempre teve por objetivo a sororidade.

O resultado disso não é "semear ódio com mais ódio", como pregam os valores cristãos. O resultado disso é como o impacto de uma eleição. Numa Marcha Feminista ofenderam católicos, logo, as católicas não se sentirão representadas e se afastarão da luta política, pelo menos, nessa em questão.

Embora o valor de uma santa quebrada não seja o mesmo que o de milhares de pessoas quebradas, mortas ou feridas pelo machismo nosso de cada dia, toda a dedicação pra trazer "pro nosso lado" mulheres católicas, evangélicas ou atéias pode ter sido jogado por água abaixo. A política tem um preço. As palavras tem peso. A mídia vai sempre procurar um motivo estúpido pra desestabilizar a Marcha. E mesmo que um crucifixo seja anatomicamente confortável e não faça mal à saúde no caso de uma masturbação como a que fizeram, é essa "ofensa" que impedirá que muitos católicos apoiem nossas convicções. 

(Não que eu espere ser apoiada por eles. Mas trazer cada vez mais mulheres para o feminismo e fazê-las perceber que vivem numa sociedade patriarcal e machista e devem lutar contra ela, é um feito memorável.)




“O preço que estamos pagando por não enfrentar é alto demais. Cada vez mais vemos pastores e padres invadindo o Estado. Cada vez mais abaixamos a cabeça e dizemos “ó, mas eles tem o direito de estar“. Como se não soubéssemos o que eles fazem quando tem o Estado nas mãos. Ao invés de ficarmos dizendo sem parar que não quebraríamos santa, está na hora de dizer que cagamos e andamos se uma santa foi quebrada.“




Fonte: Indiretas de satã (Facebook)

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